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ARTIGOS

O que você faria se só te restasse esse dia?

Não vejo a hora de viver 2013. Quero atravessar as portas de toda profecia vazia que insiste em dizer que o mundo vai acabar. Talvez precise acabar de fato para percebermos a verdade desse tempo que não dá tempo. Movemos-nos num espaço-tempo infinito e nossa grande preocupação é de quando vai acabar. Que tal pensarmos no que pode começar em 2013? Que obra você quer ver construída nesse aqui-agora e a quem você vai atribuir a autoria?
Já vivi por diversas vezes o "fim do mundo", sou testemunha ocular de como ele acabou. Na virada do milênio esperei pela catástrofe final com nuvens escurecendo o céu e pelo bug do milênio que iria dissolver todo o sistema financeiro e tudo mais. E olha só, cá estou eu, novamente entrando no ano que vai trazer o fim de tudo. Fico imaginando que essa é só mais uma tentativa de controle do ser humano sobre a vida. Sabe o que é melhor? Não controlamos nada, não sabemos nada.
De qualquer forma, se só nos restar esse ano, que tal experimentarmos o profundo mergulho no que significa ser “ser humano”. Como diria Oriah Moutain Dreamer será que você sabe o que mais deseja e se você ousa sonhar em satisfazer os anseios do seu coração. Aproveite! Mesmo que a motivação seja porque só vai te restar esse ano, assim talvez você possa chegar no fim e dizer: nossa, que ano!
Enquanto escrevo essa coluna ouço “o que você faria” do Paulinho Moska, gosto de ouvi-la, apesar de me assustar com a loucura de nossa necessidade de permanência. Esse é um grande momento para pensar em como vão os passos de minha caminhada e se estou dizendo sim para o que é realmente necessário. Para os cinéfilos de plantão, tal qual o “replicante” androide de Ridley Scott, não quero que minha vida passe como “lágrimas na chuva”. Nossa busca incansável de tempo sempre nos leva inevitavelmente para a perda dele mesmo. Ouse e viva.
Uma das dádivas da vida é perceber que tudo é um grande ciclo de começos e recomeços. Estação, pós-estação tudo se renova. Nossa experiência na Terra começa com uma inspiração e termina com uma expiração. E a vida é muito mais que nascer e morrer.
E se eu estiver errado e tudo acabar em 21 de dezembro de 2012? Tenho pensado nisso também. “Se avexe não!” nos vemos do outro lado, seja ele de que lado for, para mais uma jornada, repleta de entusiasmo, molecagem e alegria e até lá temos um ano inteiro para vivermos, dia-a-dia. Conto com vocês.

Feliz 2013

A MAGIA DA BELEZA





    As grandes tradições sempre tiveram uma grande vinculação com a beleza. Para todas essas tradições contemplar a beleza aumenta nossa vibração e nos disponibiliza para o simples. Há alguns anos li um artigo do físico Marcelo Gleiser falando sobre a harmonia e a beleza. A natureza segue leis simples que se manifestam com uma suave elegância em cada elemento da criação.  A geometria sagrada que estuda a relação entre as proporções e as formas  nos mostra como o micro e o macrocosmo se organizaram e de como tudo na natureza  é regido por essas leis. A Sequência de Fibonacci, matemático italiano do século XII, consiste em uma sucessão de números, tais que, definindo os dois primeiros números da sequência como 0 e 1, os números seguintes serão obtidos por meio da soma dos seus dois antecessores. Portanto, os números são: 0,1,1,2,3,5,8,13,21,34,55,89,144,233,... Dessa sequência, extrai-se o número conhecido como número de ouro. Quando dividimos um número pelo seu antecessor, a série converge para a seção áurea. Por exemplo, 34/21 = 1,6190..., e 144/89 = 1,61798...  Observando como a natureza se organizou de forma matemática, todos os grandes artistas renascentistas utilizaram esse número de ouro em suas criações. A formação dos cristais, a organização das galáxias, a espiral do caracol náutilus,  a curvatura do seu lábio tudo se organiza a partir da espiral áurea construída pelo número de ouro. Há uma beleza implícita na forma como natureza usou a matemática, a uma grande mágica na forma como nossa energia reage a beleza.

    Os nativos americanos tinham na ligação com a contemplação do belo uma grande fonte de energia. Hoje se sabe que nosso corpo reage de forma diferente quando estimulado por  uma imagem de negatividade. Cientistas japoneses estudam como os cristais de água congelada se organização de forma bela quando são estimulados por palavras agradáveis, meditação ou oração. Ao abrir os olhos para essa percepção de que tudo está relacionado como uma grande rede, nos abrimos para uma conexão pessoal com o divino. Essa transformação nos enche de energia e amor ilimitados o que aumenta nossa capacidade de enxergar ainda mais beleza no mundo. E de onde parte essa olhar que acessa o belo? O Olho da carne só enxerga o que é visível, o condicionado, o que muitas vezes é imposto pelo sistema. O Olho da mente só enxerga aquilo que pode ser pesado e medido. Com o olho do espírito vemos além. Para Exupery: “somente com o coração é que vemos com clareza, o essencial é invisível aos olhos”. Abrir os olhos para o belo é abrir o olhar do coração.

Para celebrar o início dessa caminhada de beleza deixo uma oração dos nativos americanos

Hoje saio à caminhar

Todo o mal me abandona

Serei tal como fui antes

Terei o corpo leve e uma brisa fresca

a percorrer-me o corpo

Hei de ser feliz para sempre

Nada há de me impedir

Eu caminho com a Beleza à minha frente

Eu caminho com a Beleza atrás de mim

Eu caminho com a Beleza acima de mim

Eu caminho com a Beleza abaixo de mim

Eu caminho com a Beleza ao meu redor

Belas serão minhas palavras.

Mytakuie Oyassin ( Somos todos parentes – prece Lakota)

 

O PODER CONTRA A FORÇA



    Há algo de especial na capacidade do ser humano de se renovar. Muito além da programação instintiva dos animais nós desenvolvemos uma qualidade essencial e que nos aproxima do que é realmente ser um ser humano, a possibilidade de irmos além da frustração e aprendermos com nossas dores e derrotas. Aprendemos muito com nossas vitórias, e somos hábeis em nos superar quando as coisas não saem como gostaríamos que saíssem. Temos sido capazes de sermos resilientes, de voltarmos ao nosso centro e nos reerguermos. Essa habilidade surge porque transformamos força em poder, transcendemos a dor e redescobrimos a vida. Em verdade, esse é o verdadeiro e único poder, o poder de auto-transformar-se. A verdadeira síntese e unificação do que somos só ocorre quando conciliamos em nós a dicotomia frustração versus realização. Todo nosso modelo atual de vida repousa em fazer, realizar, construir e vencer, e parte dos nossos tiranos internos não nos perdoa quando perdemos. Quando sofremos um golpe violento e somos endurecidos, caímos tal qual um galho seco na mata. Quando somos maleáveis e sensíveis captamos toda a gama de informação que a natureza nos traz, refazemos nosso caminho, refazemos nossos sonhos.

    Durante quase 30 anos Nelson Mandela esteve encarcerado enquanto o regime do apartheid esteve em vigor na África do Sul. Muito do que o sustentou durante esses anos veio de um poder muito além de qualquer força. Em 2009 o filme Invictus retratou a relação de Mandela com o capitão do time de Rúgbi da África do Sul. Nos anos em que esteve preso em Robben Island, para se manter são, Mandela recitava o poema Invictus, escrito em 1875, por William Ernest Henley. Para incentivar a seleção sul-africana, Mandela convocou o capitão do time, François Pienaar, ao palácio presidencial, em Pretória, onde lhe entregou uma cópia do poema. Sou um declarado torcedor da capacidade de superação do ser humano, e tenho visto que as grandes vitórias são obtidas mais pela sensibilidade do que pelo endurecimento. Não precisamos de generais ou capitães agressivos e endurecidos para mover nossos exércitos. Uma mostra do que é o verdadeiro poder e sensibilidade no poema de Henley:

De dentro da noite que me cobre,

Negra como a cova, de ponta a ponta,

Eu agradeço a quaisquer deuses que sejam,

Pela minha alma inconquistável.

Na cruel garra da situação,

Não estremeci, nem gritei em voz alta.

Sob a pancada do acaso,

Minha cabeça está ensanguentada, mas não curvada.

Além deste lugar de ira e lágrimas

Avulta-se apenas o Horror das sombras.

E apesar da ameaça dos anos,

Encontra-me, e me encontrará destemido.

Não importa quão estreito o portal,

Quão carregada de punições a lista,

Sou o mestre do meu destino:

Sou o capitão da minha alma.





Compromisso e Cuidado



 

        Enquanto os homens mergulhavam nas profundezas, a esperança brilhava na superfície. Tudo terminou bem para os 33 mineiros que, muito abaixo da terra, trabalharam em equipe, mantiveram-se vivos nas sombras e voltaram vitoriosos. Uma verdadeira jornada do herói. Tudo deu certo: os prazos foram vencidos, os equipamentos funcionaram a contento. O mundo teve um vislumbre de boas notícias, uma após a outra, subida após subida. Mais de um bilhão de pessoas foram agraciadas pela vitória da esperança. A maior tarefa desses mineiros vai ser conciliar a saída do anonimato com a "iluminação" do reconhecimento. A invisibilidade social de quem trabalha nas minas só é abalada quando algo sai errado. Felizmente, os 33 foram salvos.

        Nesse momento, onde o planeta clama por consciência, será que somos mineiros capazes de assegurar nossa sobrevivência? Até então, não sabemos se há alguém na superfície para nos salvar. Em 1887 o Cacique Seattle, em seu famoso discurso, pronunciava: "De uma coisa sabemos. A terra não pertence ao homem: é o homem que pertence à terra, disso temos certeza. Todas as coisas estão interligadas, como o sangue que une uma família. Tudo está relacionado entre si. Tudo quanto agride a terra, agride os filhos da terra. Não foi o homem quem teceu a trama da vida: ele é meramente um fio da mesma. Tudo o que ele fizer à trama, a si próprio fará."

        O evento da Mina San José, que ocorre justamente no Ano Internacional da Biodiversidade, pode servir para meditarmos sobre como estamos lidando com o planeta como um todo. Aprisionados nesse pequeno planeta azul, que navega solitário pela via láctea, 6.5 bilhões de habitantes podem transformar nossa casa numa grande mina soterrada. Dois grandes ingredientes trouxeram a vitória aos mineiros: o compromisso com a vida e o cuidado. Nada se conquista sem comprometimento, nada se sustenta sem o cuidado. Quando falo em cuidado lembro de Leonardo Boff em seu magistral Saber Cuidar (Vozes, 1999): "é o cuidado que enlaça todas as coisas; é o cuidado que traz o céu para dentro da terra e coloca a terra para dentro do céu..."

        Esse casamento entre cuidado e compromisso é o que pode nos levar a transformar a Terra num grande acampamento chamado Esperança.

ESPERANÇA

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano

Vive uma louca chamada Esperança

E ela pensa que quando todas as sirenas

Todas as buzinas

Todos os reco-recos tocarem

Atira-se

E

— ó delicioso vôo!

Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,

Outra vez criança...

E em torno dela indagará o povo:

— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?

E ela lhes dirá

(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)

Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:

— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...

Mário Quintana (Nova Antologia Poética. São Paulo: Editora Globo, 1998)





 

TRANSFORMAÇÃO E COMPROMETIMENTO


O sintoma mais doloroso das mudanças climáticas que assolam o planeta é vermos nossos irmãos desabrigados, vivendo a perda e a morte. Somos frágeis diante de tamanha mudança. As chuvas que caíram na região serrana do Rio de Janeiro mataram mais que o terremoto que ocorreu no Chile, em 2010. Nossa tarefa primordial nesse momento histórico é nos perguntarmos se estamos prontos para as mudanças que o
clima nos impõe. A questão já não é se somos ou não responsáveis pelo aquecimento global e sim se somos capazes de nos sustentarmos e sobrevivermos com as alterações climáticas que já ocorreram.

No século XVII, John Donne escreveu: “Nenhum homem é uma ilha fechada sobre si; Cada homem é uma parcela do continente, uma parte do todo. Se um torrão de terra for arrastado pelo mar, a Europa fica menor, assim como se fosse uma propriedade dos teus amigos ou mesmo tua. A morte de qualquer homem me diminui porque eu sou parte da humanidade e, portanto, nunca pergunte por quem os sinos dobram; dobram por ti”.

Somos capazes de reconhecer que somos partes de um todo? Que cada pedaço que se vai é um pedaço nosso? Nessas horas atribuladas, onde somos sacudidos e nos damos conta de nossa vulnerabilidade, surgem os heróis anônimos, que investidos de um poder sobre-humano, cavam o chão com suas próprias mãos para resgatar os soterrados, partilham a sua casa, seu alimento e a sua fé. Nesses momentos, nos tornamos verdadeiramente humanos.

Até que sejamos todos capazes de alcançar essa real condição de Ser, que partilha e age, busquemos a transformação em nós:

Deus pai-mãe,
Que estais no Centro Espiritual do Universo a que chamamos de CÉU e que habita
dentro de nós.
Ajudai-nos a manter nossa palavra impecável como o teu nome.
Fazei com que reconheçamos que o teu reino e o nosso são um só.
Que estejamos atentos para que nossa vontade esteja de acordo com o melhor para nossa
Terra, a que chamamos de mãe.
Que saibamos dividir o pão que nos nutre a cada dia.
Fazei com que aprendamos a não ser escravos do nosso próprio julgamento, buscando a
causa mais em nós, do que no próximo.
Que nos lembremos de estar conscientes, cada vez que cairmos em tentação.
E livrai-nos de não sermos capazes de reconhecer o mal em nós. Amém







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